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Angola: Jurista teme "convulsão popular" após decisão do TC

9 de setembro de 2022

O jurista angolano Serrote Simão Hebo já esperava que o Tribunal Constitucional rejeitasse o recurso da UNITA e validasse a vitória do MPLA nas eleições. Em entrevista à DW, alerta para eventuais protestos e detenções.

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Foto: Siphiwe Sibeko/REUTERS

O Tribunal Constitucional (TC) de Angola negou esta quinta-feira (08.09) provimento ao recurso de contencioso eleitoral interposto pela União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA). O maior partido da oposição em Angola contesta a vitória do MPLA nas eleições gerais.

Mas segundo o acórdão do Constitucional, os elementos de prova apresentados pela UNITA "não colocam em causa os resultados gerais decorrentes do apuramento nacional dos votos divulgados pela Comissão Nacional Eleitoral (CNE)."

Em entrevista à DW África, o jurista Serrote Simão Hebo afirma que a decisão do TC era previsível e teme que, perante este desfecho, o país assista agora a uma "convulsão popular".

Tribunal Constitucional validou vitória do MPLA nas eleições
Tribunal Constitucional validou vitória do MPLA nas eleiçõesFoto: B. Ndomba/DW

DW África: Já esperava esta decisão do Tribunal Constitucional?

Serrote Simão Hebo (SSH): A nossa questão consiste na fundamentação que o tribunal apresentou. Portanto, penso que o problema está ali. Não se esperava uma outra posição senão esta, depois dos comentários do porta-voz da Comissão Nacional Eleitoral, aquando da solicitação do Tribunal Constitucional que não apreciasse as reclamações. Tanto que não era competência da CNE apelar ao Tribunal a não apreciar. Esse dado é que efetivamente já coloca em causa toda a lisura, toda a apreciação que o Tribunal fez em torno desse processo. Aliás, outro dado interessante aqui é o facto de que quando se estava ainda em sede de apreciação de recurso, o concorrente das eleições, no caso o MPLA, já estava a organizar essa atividade da investidura.

DW África: Face a este desfecho, podemos dizer que fica fechado, em definitivo, o processo eleitoral das quintas eleições no país ou judicialmente há margem para um novo recurso?

SSH: Com esta decisão, obviamente que a UNITA esgota do ponto de vista judicial interpor um outro recurso. Sendo assim, o que vai restar à oposição é levar a população para as ruas no sentido de procurar persuadir de facto o tribunal a ter uma posição diferente. Porque se o tribunal entender que a população está contra o acórdão que proferiu nesta instância, poderá mudar. Mas atenção, isso ocorre naqueles tribunais com responsabilidade de Estado como deve ser e não nos nossos tribunais. Falo em concreto do Tribunal Eleitoral. Digo isso em função da composição que o tribunal apresenta. A maior parte desses juízes, e até mesmo os assessores deste mesmo tribunal, são membros afetos, ou foram membros, do partido político que governa o país, o partido do Estado.

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DW África: Os partidos da oposição anunciaram, mesmo antes de ser conhecida a decisão do TC, a criação de um grupo de trabalho para convocar manifestações. Com este desfecho, pode-se esperar uma "convulsão social"?

SSH: A questão que se coloca aqui é qual vai ser efetivamente o papel da ordem, da Polícia Nacional. Então, desta fúria, naturalmente que se pode esperar alguma convulsão popular. Alguns ânimos podem, digamos, sair do controlo e aí, então, vamos ter um conjunto de protestos, vamos ter detenções de um lado para o outro. A polícia vai jogar duro na situação, vai efetivamente ser implacável e pode-se esperar isso. E se a polícia for implacável, obviamente vamos ter muitas detenções e, eventualmente, situações em que podem perder o controlo.

DW África: A UNITA tinha ameaçado recorrer a tribunais internacionais embora o TC tenha afastado de imediato essa hipótese. Instâncias internacionais poderiam a mudar o cenário atual?

SSH: Do ponto de vista jurídico, penso que não é possível porque o tribunal internacional tem uma natureza própria e julga processos constantes do Estatuto de Roma, que são os crimes de guerra, genocídios, agressões graves. O que me parece é que isto vai ser levantado numa perspetiva jurídica, no sentido de suscitar com que os observadores de Estados internacionais, outros observadores, possam intervir, fazer uma diplomacia junto do Estado angolano para efetivamente conciliar as instituições com os partidos reclamantes, no sentido, de facto, de rever efetivamente as reclamações. Mas, diante dessa decisão do Tribunal Constitucional, penso que não haverá muitas possibilidades para haver este pedido.

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