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Ainda sem posição, União Africana vê Líbia com cautela

23 de agosto de 2011

Rebeldes controlam a quase totalidade da capital Trípoli, mas reunião de urgência não resultou em posição do órgão. UA convocou encontro de chefes de Estado do Conselho de Paz e Segurança para sexta-feira (26/8).

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Combatentes rebeldes observam confrontos próximo ao complexo principal de Mouammar Kadhafi, no distrito de Bab al-Aziziya, em Trípoli
Combatentes rebeldes observam confrontos próximo ao complexo principal de Mouammar Kadhafi, no distrito de Bab al-Aziziya, em TrípoliFoto: dapd

Uma reunião à porta fechada da União Africana (UA) em Adis Abeba, capital da Etiópia e sede do órgão, serviu para discutir minuciosamente a evolução da situação na Líbia na segunda-feira (22/8). Porém, o encontro não resultou em tomada de posição do órgão africano, que aproveitou para preparar uma reunião de chefes de Estado do Conselho de Paz e Segurança da União Africana para o final da semana (26/8).

Até lá, segundo a Deutsche Welle apurou, os diplomatas da UA parecem esperar que a situação na Líbia tenha ficado mais clara – com a definição, os chefes de Estado e de governo da UA (da qual participam todos os países africanos, menos o Marrocos) poderiam reconhecer oficialmente o Conselho Nacional de Transição (CNT) rebelde.

Nesta terça-feira (23) continuavam os enfrentamentos entre rebeldes e forças leais ao presidente líbio Mouammar Kadhafi na capital do país do norte africano. Os rebeldes iniciaram ofensiva a Trípoli no fim de semana e já estariam em controle da quase totalidade da cidade.

Seif al-Islam, filho de Kadhafi, apareceu nesta terça-feira (23) em Trípoli, um dia depois de rebeldes terem dito que o tinham capturado
Seif al-Islam, filho de Kadhafi, apareceu nesta terça-feira (23) em Trípoli, um dia depois de rebeldes terem dito que o tinham capturadoFoto: dapd

De acordo com a rede de televisão Al Arabyia, citada por agências noticiosas, os rebeldes líbios forçaram o primeiro portão do complexo do quartel general de Mouammar Kadhafi em Trípoli nesta terça-feira. Mais cedo, os insurgentes tinham intensificado os ataques contra o complexo de Bab al-Aziziya, no centro-sul da capital.

Também na terça-feira, a agência noticiosa russa Interfax divulgou que o presidente russo da Federação Internacional de Xadrez, Kirsan Iliumjinov, teria tido contato telefônico com Kadhafi. O dirigente líbio teria dito que está em Trípoli e que não tem intenção de deixar a Líbia, lutando até o fim.

No plano diplomático, a França – um dos primeiros países a apoiar a insurreição líbia contra Kadhafi – propôs acolher uma reunião do grupo de contato sobre a Líbia a partir da próxima semana, para definir um plano de auxílio num cenário pós-Kadhafi. O Secretário geral das Nações Unidas, Ban Ki-moon, anunciou na segunda-feira (22) que convocaria esta semana uma cimeira sobre a situação na Líbia, com presença de dirigentes da União Africana e da Liga Árabe, assim como de outras organizações regionais.

Com investimentos, dirigente líbio conquistou imagem positiva

Há seis meses, Mouammar Kadhafi resiste a protestos, rebelião e intervenção militar internacional coordenada pela Organização do Tratado do Atlântico Norte (NATO) – que também debate a situação na Líbia nesta terça-feira (23). Mas, em muitas capitais africanas, o dirigente líbio costumava ser um estreito aliado. Ou, pelo menos, um hóspede visto com bons olhos.

Rebeldes líbios fazem o sinal da vitória no distrito de Gorgi, em Trípoli (23/8)
Rebeldes líbios fazem o sinal da vitória no distrito de Gorgi, em Trípoli (23/8)Foto: dapd

Nos últimos anos, o governo líbio e empresas estatais investiram milhões de euros em todo o continente. No Quênia, por exemplo, os responsáveis comerciais de Kadhafi compraram hotéis de luxo e a metade da refinaria estatal de petróleo. Apenas a construção de um novo oleoduto para o oeste custou 70 milhões de dólares à Líbia.

Segundo observadores, talvez seja esse o motivo pelo qual o ministro das Relações Exteriores do Quênia, Richard Onyonka, defina o dia da invasão de Trípoli pelos rebeldes com um dia triste para a África: “Os quenianos viam Kadhafi como alguém que fez muitas coisas boas, especialmente para os movimentos de libertação africanos”, diz o ministro. “Ele desempenhou papel importante na luta contra o apartheid [regime segregacionista racial de minoria branca na África do Sul] e também contra o neocolonialismo na África austral. Quando combatentes pela liberdade precisaram de apoio, Kadhafi ajudou”, afirma Onyonka.

Por outro lado, Onyonka diz acreditar que Kadhafi não deixou o poder a tempo. “Um dos lados ruins do regime de Kadhafi é que não é certo governar um país durante 42 anos. Não faz sentido”, explica. “As crianças que nasceram quando Kadhafi chegou ao poder agora têm 42 anos. Querem mudanças. A internet lhes deu a idéia da liberdade. Este pode ter sido o maior erro de Kadhafi: quando ele deveria ter ido, agarrou-se ao poder – e, por isso, perdeu esse poder”, avalia.

Amigos e inimigos

Kadhafi também teria tido influência em diversas guerras civis africanas. No conflito de Darfur – região oeste do Sudão –, o presidente líbio financiou tanto o lado sudanês como o chadiano, mantendo combates. Na República Centro-Africana, Kadhafi chegou a dar apoio a alguns ditadores com fornecimento de armas e tropas. Com os milhões do petróleo líbio, Kadhafi teria até ajudado a financiar a ascensão do presidente da África do Sul, Jacob Zuma – o que este contesta.

O presidente líbio, porém, não conseguiu apenas amigos em 42 anos no poder: na Nigéria, por exemplo, Kadhafi nunca teria sido perdoado por recomendar a divisão do país numa metade cristã e em outra muçulmana.

Na União Africana, muitos ainda parecem se lembrar da atuação – considerada “bizarra” por observadores – de Kadhafi na altura em que ele assumiu a direção do órgão. Naquela época, Kadhafi fez-se coroar rei de todos os africanos e causou polêmica algumas vezes, por exemplo quando defendeu piratas somalis como combatentes pela liberdade.

Autor: Marc Engelhardt (Nairóbi) / Renate Krieger (com agências afp/Reuters/dpa)
Edição: António Rocha

Rebeldes líbios diante de carro em chamas depois de terem sido atacados por forças pró-Kadhafi (22/8)
Rebeldes líbios diante de carro em chamas depois de terem sido atacados por forças pró-Kadhafi (22/8)Foto: dapd