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Os reflexos globais da destruição de barragem na Ucrânia

17 de junho de 2023

Milhares de hectares de terras agrícolas ficarão desertos como resultado do colapso da barragem de Kakhovka. As consequências também poderão ser sentidas internacionalmente a longo prazo.

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Represa quase totalmente seca, com baixo nível de água
Sem a represa de Kakhovka, grandes canais de irrigação na margem esquerda do Dnipro não recebem mais águaFoto: Nina Liashonok/Ukrinform/ABACAPRESS/IMAGO

"De qualquer maneira, não posso cultivar minha terra desde que ela foi confiscada pelas forças de ocupação. Mas agora não haverá mais água", diz à DW o agricultor ucraniano Wasyl R.. "Em fevereiro passado, os russos vieram e anunciaram que os campos e todas as propriedades da minha fazenda seriam 'nacionalizados'."

Por questões de segurança, o fazendeiro teve que deixar as áreas ocupadas pelos russos no ano passado, então ele não quer que seu nome verdadeiro apareça na mídia – isso pode colocar em risco seus pais, que ainda moram lá.

A situação dele é parecida com a de muitos agricultores da região de Kherson, no sul da Ucrânia, que se encontra, em grande parte, ocupada pela Rússia desde o primeiro semestre de 2022, assim como a região vizinha de Zaporíjia. Muitos residentes fugiram dos invasores, indo para outras regiões ucranianas.

Sem água não há cultivo

Apenas alguns meses após a expropriação, a destruição da barragem de Kakhovka foi o próximo choque para Wasyl R. Desde a noite de 6 de junho, os 3 mil hectares cultivados de sua fazenda foram cortados da irrigação e correm o risco de se tornar desertos. É uma má notícia para ele e para os inúmeros fazendeiros do sul da Ucrânia.

Segundo o Ministério da Agricultura ucraniano, quase 600 mil hectares foram afetados no árido sul da Ucrânia, terras que sem a água da barragem que foi destruída, não podem mais ser cultivadas. Antes da guerra, até quatro milhões de toneladas de grãos e oleaginosas no valor de 1,5 bilhão de dólares foram colhidas aqui.

Campo de trigo
Campo de trigo na Ucrânia: logo após a destruição da barragem de Kakhovka, preços dos grãos subiram em média 3%Foto: Alexander Reka/TASS/dpa/picture alliance

Além das regiões de Kherson e Zaporíjia, também os agricultores da Crimeia, anexada pela Rússia, estão perdendo todas as perspectivas com a destruição da barragem de Kakhovka. Porque o Canal da Crimeia do Norte, que também é alimentado pelo enorme reservatório de água da barragem do Dnipro, logo secará, segundo especialistas.

Destruição da barragem afeta sobretudo áreas ocupadas

No que diz respeito à economia ucraniana como um todo, a ameaça de desertificação dessas áreas provavelmente terá apenas consequências muito limitadas por enquanto. A maioria das fazendas afetadas está localizada em território ocupado pela Rússia. Sua produção não chegava ao mercado ucraniano desde 2022, o que provocou aumentos significativos nos preços dos produtos agrícolas já naquela época. E as importações de legumes aumentaram 66%.

Antes da guerra, Kherson produzia 12% do total de hortaliças do país em pouco mais de 2% das terras agrícolas. Desde o início da guerra, a Ucrânia perdeu 36% de toda a safra de tomate. "Os tomates do sul da Ucrânia são os melhores, com um sabor particularmente doce. Com irrigação suficiente, eles amadurecem particularmente bem sob o sol do sul", diz Yuriy Lupenko, do Instituto de Economia Agrícola de Kiev. Agora, sem água do reservatório de Kakhovka, os agricultores do sul da Ucrânia perderiam seus meios de subsistência. Lupenko adverte que pode haver uma escassez permanente de legumes.

Impacto na luta contra a fome

"A destruição da barragem não tem consequências diretas para as exportações de grãos ucranianos porque as áreas afetadas estão isoladas dos mercados internacionais desde 2022. No entanto, qualquer má notícia da Ucrânia leva a flutuações de preços", adverte Stephan von Cramon-Taubadel, professor de economia agrícola na Universidade Georg-August, em Göttingen, Alemanha. "A tensão resulta da soma de muitas incertezas. Os preços podem oscilar muito rapidamente com a chegada de novas notícias."

Vista aérea de cidade inundada
Paisagem de inundação na região de Kherson após destruição da barragemFoto: Inna Varenytsia/REUTERS

Imediatamente após a destruição da barragem de Kakhovka, os preços dos grãos nos centros comerciais internacionais subiram em média 3%. O economista agrícola de Göttingen enfatiza que o nervosismo continuará enquanto durar a guerra de agressão russa contra a Ucrânia. Boas colheitas nos países agrícolas mais importantes, incluindo a Rússia, e previsões positivas para 2023 trouxeram preços relativamente baixos para os importadores, incluindo muitos países mais pobres do Sul Global. "Mas, a longo prazo, o mundo não pode prescindir de grande parte da produção agrícola ucraniana na luta contra a fome", enfatiza o especialista.

"Se esta região for cada vez mais afetada a médio prazo por danos de guerra como o rompimento da barragem, então é como se tivéssemos que ir à guerra contra a fome mundial com um braço amarrado nas costas", diz Stephan von Cramon-Taubadel. Ele lembra como a Rússia questiona repetidamente a extensão do acordo de grãos e, portanto, as exportações da Ucrânia, o que sempre causa novos nervosismos no mercado.

Esperança em recomeço ainda existe

Wasyl R., o agricultor da região de Kherson, vive atualmente no oeste da Ucrânia. Mesmo que sua região natal ameace secar sem a irrigação do Dnipro, ele deposita todas as suas esperanças na contraofensiva do exército ucraniano. "Voltaremos e reconstruiremos nossa fazenda. Será difícil porque teremos que cavar fundo para encontrar água. E isso nos levará pelo menos três a cinco anos." Ainda assim, Wasyl não pensa em desistir.

Na verdade, as perspectivas para os agricultores do sul da Ucrânia não são nada animadoras. Muitos tiveram que parar completamente a produção por causa da guerra ou por falta de oportunidades de vendas. A logística também sofrerá com a destruição da barragem. Isso ocorre porque a última seção do rio Dnipro antes de desaguar no Mar Negro não será mais transitável para o transporte marítimo.